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sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

ARQUITETURA DA PAISAGEM



A arquitetura da paisagem trabalha a composição e a organização dos espaços externos, sendo eles naturais ou artificiais, e de dimensões e escalas diversas.


Introdução

A grande diversidade territorial e paisagística brasileira resulta em diferentes configurações formais de espaços edificados e não edificados, condicionando estruturas urbanas segundo modelos de ocupação diferenciados. Essas estruturas e modelos diversificados são consequência de aspectos ambientais, sócio-econômicos e culturais e o entendimento das diferenças regionais, assim como das contradições sociais, faz-se por meio do estudo da realidade existente, através de visões necessariamente interdisciplinares.

O estudo da validade dos modelos de ocupação adotados pela sociedade em função da sua adequação à diversidade territorial deve ser feito por meio do entendimento dos ecossistemas envolvidos, da geomorfologia, das formas de apropriação dos recursos naturais, das distintas escalas e dimensões territoriais dos núcleos urbanos e dos traços sócio-culturais de seus ocupantes.

Portanto dentro desta perspectiva encontra-se a conjugação entre campos disciplinares que, integrados, permitem a compreensão dos processos de constituição da paisagem sob o ponto de vista da ecologia.

Uma das contribuições dos estudos sobre arquitetura da paisagem reside no entendimento dos processos de constituição morfológica, dos históricos de ocupação, dos padrões arquitetônicos e urbanos resultantes e dos impactos que esses exercem sobre o meio físico e social.

Conceitos e premissas

O primeiro passo para a visão interdisciplinar no tema em questão é perceber a relação existente entre a ecologia da paisagem e a arquitetura da paisagem, campo onde arquitetos, paisagistas e urbanistas contribuem como pesquisadores, estudiosos e profissionais.

Para tanto, é importante discernir a relação entre as escalas territoriais de atuação e os recortes de análise e de pesquisa a que se propõe.

Ao discutirmos a escala do território nacional, estaremos analisando a relação entre a forma de ocupação das regiões, as trocas entre elas e as suas formas produtivas, tendo como referência a sua adequação às características e abrangência dos domínios paisagísticos e dos ecossistemas existentes.

Na escala da região, a análise e definição de parâmetros de ocupação do território se iniciam a partir da leitura acima, com uma perspectiva mais aproximada à ocupação humana, onde, reside o entendimento mais direto da relação entre as matrizes de ocupação, os fragmentos dessas matrizes e os corredores que as interligam. Vários estudos se desenvolveram nos últimos anos no Brasil, ora relativos à relação entre zonas urbanas e rurais, aos estudos de processamentos de ecossistemas específicos e ao entendimento das estruturas do território regionais.

Finalmente na escala das cidades reside a maior contribuição da arquitetura da paisagem no sentido do entendimento da relação entre as matrizes urbanas e as matrizes não urbanas – sistemas naturais transformados, ou em transformação, onde se buscar entender, como premissa para a ocupação, a relação entre os preceitos de planejamento da paisagem e as demandas de planejamento urbano. Nesse caso, a abrangência sócio-ambiental, que essa escala estabelece, deve pressupor a integração direta entre esses dois campos de conhecimento e prática profissional.

Contribuições de pesquisa e as práticas públicas

No campo disciplinar da pesquisa em arquitetura da paisagem, existem lacunas de estudo, dentre as quais, destaca-se a necessidade de análise e revisão dos modelos de ocupação e dos sistemas de espaços livres resultantes, sob o ponto de vista da sua adequação morfológica, programática e ambiental, e dos conceitos agregados às situações descritas acima.

Os modelos de ocupação urbana e o sistema de espaços livres resultantes afetam diretamente o processo de produção do espaço e da paisagem, constituindo-se em objeto de pesquisa, relacionado às escalas de análise ambiental abordadas – territorial, regional e local, e que deve integrar os diversos campos disciplinares envolvidos: desde os que apresentam viés analítico e diretivo – história, geografia, ecologia, agronomia, engenharias florestal e hidráulica, dentre os mais importantes, àqueles com perfil propositivo, como a arquitetura, o urbanismo e o paisagismo.

O processo de construção da paisagem indica a existência de modelos de ocupação urbana resultantes de variáveis econômicas e culturais, decorrentes da forma como a sociedade ocupa, apropria-se e gere o território.

O resultado desses modelos reflete a conjugação de processos éticos e estéticos, muitas vezes uniformizadores, em seu conteúdo ideológico e discursivo, que irão conformar a paisagem como um produto sócio-cultural refletido sobre um suporte físico com características muito diversas.

Nesse contexto o conjunto de espaços livres, pertencentes à esfera pública, reflete de forma sistêmica, processual e permanente, as consequências da aplicação de modelos de ocupação urbana sem a necessária avaliação das características territoriais, implicando em situações de comprometimento ambiental irreversível.

Em meio urbano, na esfera estadual e municipal, a poluição dos cursos d´água, a ocupação de mananciais, o comprometimento das encostas ocupadas, as modificações dos níveis de lençol freático, o desmatamento e diminuição da massa vegetal, a impermeabilização crescente dos solos urbanos, a má distribuição dos espaços livres no tecido, o desequilíbrio das condições climáticas, dentre outros fatores, são indicativos da inexistência da sistemática de integração disciplinar entre a  concepção, o desenho e a gestão pública e privada das nossas cidades e os critérios ambientais e paisagísticos que os deveriam preceder.

Em meio territorial, na esfera federal, a não observação do equilíbrio entre domínios naturais e ocupação produtiva tem levado a conseqüências negativas no tocante ao equilíbrio entre ocupação humana, instalação e operacionalização de infraestrutura, apropriação de recursos e manutenção do equilíbrio dos ecossistemas existentes.

A partir dessa aproximação ao tema, estabelecemos as seguintes hipóteses:

·      Os processos e os modelos de ocupação urbana explicam e justificam ações da esfera
pública no território, refletindo-se diretamente  no objeto de estudo selecionado: o sistema de espaços livres públicos;

·      A relação entre os preceitos de planejamento da paisagem e as demandas de
planejamento urbano deve ser entendida como pressuposto para a integração direta entre esses dois campos de conhecimento e prática profissional;

·      Os planos diretores, recentemente elaborados ou revisados, devem incorporar, em
seu conteúdo, diretrizes quanto aos sistemas existentes e previstos de espaços livres, incluídas nos princípios de processamento e apropriação da paisagem, de forma integrada às diretrizes quanto ao ordenamento territorial, onde novos modelos de ocupação, densificação e/ou expansão urbanas são estabelecidos;

·      Os espaços livres públicos passam a ter um importante papel ambiental, além das
abordagens tradicionais que os relacionam com espaços de circulação, lazer e contemplação. Portanto o sistema de espaços livres públicos considera os recursos naturais do território de forma a garantir o direito à qualidade de vida de seus cidadãos.

Nesse contexto, a contribuição científica sobre a conceituação dos sistemas de espaços livres, que busca a integração e a interdisciplinaridade defendidas acima, não está ainda sistematizada a ponto de favorecer argumentos que promovam a qualificação dos sistemas existentes, adequando-se e integrando-se aos demais campos disciplinares e às políticas públicas que, em última análise regulamentam e direcionam a ocupação.

Na maioria dos casos as instâncias públicas que lidam com o assunto carecem de uma conceituação teórica e conceitual, fato esse que pode ser identificado desde as denominações utilizadas em seus instrumentos legais até às diretrizes por esses estabelecidas

A aproximação entre academia e a esfera das decisões públicas é, portanto, fundamental para o direcionamento propositivo da ocupação territorial, em suas diversas escalas, devendo se pautar na interdisciplinaridade dos campos de conhecimento, pesquisa e prática.

Planejamento urbano x planejamento da paisagem: à guisa de reflexão

Em processo recente junto ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), encaminharam a proposta de pesquisa cujo objetivo é a análise do sistema de espaços livres e dos modelos de ocupação urbana correlatos no Estado do Rio de Janeiro, sob a luz dos conteúdos dos Planos Diretores Municipais.

Através da leitura crítica dos conteúdos dos planos, da análise do sistema de espaços livres e dos modelos de ocupação urbana, pretende-se questionar sua adequação morfológica e ambiental, levando-se em consideração os contextos históricos e culturais que os geraram, como eixo propulsor da ocupação.

Desta forma, ao analisar os conteúdos desses planos, cujo encerramento era previsto para outubro de 2006, podemos ter um quadro analítico e comparativo que nos possibilitará elencar as principais orientações legais e as direções que deverão tomar as instâncias municipais em relação ao território e a sua gestão, procurando destacar as relações entre as condicionantes ambientais, as demandas sociais e os modelos propostos para o crescimento e adensamento urbanos. Deverão também ser confrontadas as determinações de instância municipal e as legislações vigentes de âmbito federal e estadual.

A Constituição Federal já estabelecia em 1988 duas premissas importantes ao se referir ao ordenamento territorial, relativas à política de desenvolvimento urbano e à definição de propriedade, como abaixo:

·      A política de desenvolvimento urbano tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes;

·      A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no Plano Diretor.

No decorrer desses vinte e quatro anos ainda não vimos uma mudança significativa tanto nas políticas municipais como na discussão do papel que cumprem as esferas públicas e privadas no tocante à propriedade e gestão do espaço urbano.

O Estatuto da Cidade, promulgado em 2001, regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988 e, ao estabelecer diretrizes gerais da política urbana. A oportunidade de verificar os novos posicionamentos contidos nos planos diretores, desenvolvidos entre 2001 e 2006, assim como analisar as diversidades de políticas, discursos e diretrizes previstas nos possibilitará estudar de que forma os aspectos substantivos e qualitativos, referentes aos sistemas de espaços livres, em suas diversas escalas e funções, estão sendo argumentados e direcionados nos diferentes municípios.

O Estatuto da Cidade cria instrumentos para que o Município possa intervir no desenvolvimento de todo o território municipal de forma a promover a democratização do acesso ao solo urbano assim como promover a regularização fundiária. Entendemos que a qualificação dos espaços livres, de forma a formarem um sistema que atenda às expectativas de qualidade de vida do cidadão, só pode ser adquirida por meio da qualificação do acesso aos espaços públicos.

A Campanha “Planos Diretores Participativos”, iniciada em 2004, ilustra essa grande mobilização, que atingiu municípios de portes diversos, desde as regiões metropolitanas das capitais até esferas municipais de pequeno porte, distribuídas pelo território nacional.

Segundo a Rede “Plano Diretor”, do Ministério das Cidades, cerca de  1.682 municípios apresentam obrigatoriedade legal na realização do Plano, e esse Ministério aplicou pesquisa em cerca de 93% do universo, para averiguar os resultados desses planos. Esses dados, segundo a rede, estão em fase de tabulação, e viabilizarão obter uma perspectiva dos conteúdos e dos processos aplicados.

A universidade cumpre seu papel ao contribuir com a análise desses dados que são frutos do esforço de milhares de municípios. A análise crítica e focada deve promover o avanço e aprofundamento das questões ali levantadas.

Conclusões sobre os resultados esperados

Espera-se, com a pesquisa proposta, montar quadros comparativos dos modelos de ocupação urbana e de seus resultados no sistema de espaços livres, a partir dos recortes estudados, buscando-se compará-los a outros exemplos existentes na própria cidade e em outras cidades do país.

Será possível montar esses quadros a partir de trocas de experiências em seminários e oficinas a serem realizados de forma integrada com órgãos de gestão e planejamento assim como com demais laboratórios de pesquisa na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e em outras universidades.

A partir das conclusões geradas pela pesquisa, espera-se também compor um quadro de recomendações a respeito do uso dos modelos de ocupação urbana e da qualidade do sistema de espaços livres, enfocando as diretrizes serem incorporadas aos planos diretores e demais instrumentos legais.

Essas recomendações podem se tornar um corpo crítico e analítico das legislações que regem a atividade de produção dos espaços construídos e não construídos, prevendo futuras aplicações.

Estima-se que as recomendações girem em torno de:

·      Desenho da paisagem: suporte físico e legal

Para tanto, espera-se:

®  a revisão das  medidas legais, incluindo parâmetros de uso e ocupação  do solo
(índices de aproveitamento, taxas de ocupação, profundidades de construção, remembramentos e desmembramentos), visando a valorização dos tipos morfológicos adequados aos sistemas ambientais locais.

·      Preservação de patrimônio ambiental e sócio-cultural

As recomendações feitas em relação ao patrimônio ambiental e sócio-cultural visam a valorização dos espaços livres existentes e a serem criados, enfatizando a esfera pública e a melhoria do ambiente natural e construído.

·      Adequação ambiental

Nesse sentido, espera-se:

®  a indicação  de áreas  especiais de preservação ambiental, elevando a quantidade de
áreas livres e melhorando o equilíbrio entre a massa edificada e os espaços livres vegetados;

®  a indicação da destinação de espaços existentes que, além da preservação de recursos
ambientais, atenderiam à demanda por áreas recreativas.

®  a indicação  de uma política de incentivos, fiscais e creditícios, a ações particulares,
voltadas ao aumento da massa de vegetação urbana, tais como o reflorestamento das áreas de preservação existentes e a serem criadas.

®  a indicação de programas especiais de educação ambiental enfatizando a valorização
da vegetação urbana, o destino do lixo domiciliar e a preservação dos cursos d’água.

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